20 dias a bordo

Por: Redação -
03/12/2015

No mês de novembro fui convidada para fazer parte da tripulação de um delivery na entrega de um catamarã 62 pés pela costa do Pacífico Mexicano até a Baja California. Embarquei no pequeno vilarejo mexicano chamado Huatulco, no estado de Oaxaca. Trata-se de um novo refúgio na região para os novos ricos que buscam condomínios de frente para o mar com varanda gourmet, piscina com borda infinita, uma praia paradisíaca, bons restaurantes e surf de qualidade. Logo que cheguei fui ao encontro do resto da tripulação na Marina Chahue onde o catamarã estava atracado. Uma marina bastante bonitinha com escola de mergulho, bar, restaurante e ótimo wifi.

#Dia 1

Minha maior surpresa foi ao chegar no barco, já havia navegado em catamarãs mas nunca em um 62 pés. A imponência do tamanho, do espaço e do conforto impressionam. Pensei “essas milhas navegadas vão ser um luxo!” E realmente foram em grande parte das 900 milhas percorridas.

Vivi a bordo desse catamarã por quase um mês. Pra quem estava acostumada a cozinhar navegando em uma cozinha de 1m/1m, com fogão de duas bocas, sem geladeira funcionando durante a navegação (muito menos freezer) e com tanques de 90 galões de água, sem dessalinizador, preparar os pratos e lavar a louça nessa travessia foi “baba”!

#Dia 5

Partida para Acapulco. 240 milhas navegadas. Duas noites a bordo. Navegação tranquila, porém no contra-vento. Monitoramos o tempo todo. Tempo favorável.

O barco contava com uma ampla cozinha que tinha tudo, freezer, geladeira, microondas, máquina de lavar louças, fogão com 5 bocas, uma bancada bastante grande e confortável, enfim, a cozinha dos sonhos para quem vive a bordo. E contava, ainda, com dois tanques de 140 galões de água e um dessalinizador que produzia cerca de 200 litros por hora de água potável. Bom, é nessa hora que mesmo com a fartura, o que deve falar mais alto é o bom senso no não desperdício de água!

O espaço que havia nas cabines e no deque superior proporcionavam um extremo conforto. Como éramos em cinco, tinha espaço e cabine para todo mundo. Um verdadeiro apartamento flutuante!

A rotina da tripulação era muito bem dividia e é assim mesmo que recomenda-se durante uma travessia em barco. O capitão manda, o primeiro marinheiro executa, a mulherada cozinha, arruma o “apê” e todo mundo participa dos turnos.

Para quem acompanha minhas colunas aqui sabe o quanto ressalto sobre a importância de aprender a viver com pouco no mar. Bem, quando se vive em um catamarã de 62 pés o desafio é ainda maior, afinal, não é porque tem que precisamos gastar!

#Dia 12

Depois de mais 140 milhas navegadas, chegamos em Tenacatita. Essa foi uma das regiões mais devastadas pelo furacão Patrícia. Triste ver as casas sem teto e um clima de destruição na cidade. Como nosso plano não era desembarcar, acabei descendo em terra apenas um dia para conhecer. Remei até a costa de SUP, caminhei 40 minutos até o centrinho, tomei uma cerveja e voltei.

Entre os turnos, quando não estávamos cozinhando, ficávamos interagindo com a natureza ou lendo um livro, tocando violão, ouvindo uma música…

#Dia 18

Dia de zarpar de Punta Mita, Puerto Vallarta. O tempo estava favorável e tínhamos que nos apressar em chegar porque uma tempestade subtropical com possibilidade de se tornar furacão se aproximava da Baja California. Pela previsão, chegaríamos antes.

No total, fizemos as 900 milhas em 20 dias. Fomos parando em alguns vilarejos até chegar à Baja California. Velejamos muito pouco porque fomos com contra-vento quase a maior parte da viagem.

Um dos momentos mais esperado durante as travessias era o pôr do sol. Era colocada uma música inspiradora, como um Pink Floid, por exemplo, e todos subiam no deque superior para olhar o sol apagar ao tocar o oceano.

Conversando com a tripulação, eles me falaram que o proprietário usa o barco apenas para “daysailing”, ou seja, tem um apartamento em terra e outro no mar. Nada contra, pelo contrário é um luxo para poucos. Porque uma coisa é bem diferente da outra. Ter um barco e viver em um barco.

Quando você vive em um barco, você aprende com as necessidades do dia-a-dia, quando você tem um barco, você pode aprender, ou não.

#Dia 20

Depois de 270 milhas navegadas desde Puerto Vallarta, chegamos em Baja California, em San Jose del Cabo, nosso destino final. Essa última perna foi a mais longa e a mais turbulenta.

Nessa travessia, como não fomos costeando, tudo o que víamos era só mar. Nos organizávamos em turnos de 3 horas durante à noite. Um momento mágico era quando o sol vinha dar bom dia. Durante o dia, fazíamos rodízio de acordo com o cansaço de cada um.

Já peguei muito vento na cara e mar picado com monocasco, mas com catamarã foi a primeira vez. O balanço é quadrado e quando bate, bate mesmo, chacoalha tudo. A sorte é que nunca fiquei mareada porque teve “perna” que foi assim do início ao fim. Impossível dormir nas cabines de proa.

Quando vinha a vaga, o barco subia e descia como em uma montanha russa, mas algumas vezes caía lá de cima batendo seco na água, ou seja, quando subia nunca sabíamos como iria descer. As vagas não eram grandes, tinham cerca de 2 metros de altura, mas como o intervalo entre elas era muito curto, o mar estava todo picado.

Os presentes dessas travessias foram aqueles que a natureza nos dá apenas quando se está 100% conectado com ela. Incontáveis estrelas cadentes, a visita de golfinhos na proa, a pesca de peixe-vela e claro! sua devolução ao mar, o sol se pondo no oceano e a beleza do sol nascendo. Aliás, uma peculiaridade, antes do sol dar bom dia, um tom rosa com lilás toma conta do céu anunciando a vinda do astro rei, logo depois, ele aparece com tons que vão do laranja ao rosa pink, bastante tímido na linha do horizonte. Aparece apenas por alguns minutos, para sumir de novo no azulado do céu, e para então voltar imponente no alto, com seu amarelo característico, iluminando o dia.

Poder detalhar assim a vinda do Sol é mais que um presente é uma dádiva da vida a bordo.

Marinheiro que é marinheiro tem que seguir em frente!

Hoje estou aqui, amanhã não sei!

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Marcela Rocha é instrutora de mergulho, jornalista, locutora de rádio, velejadora nas horas vagas e, acima de tudo, muito feminina

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