Velejador francês Francis Joyon é uma das maiores lendas da vela oceânica mundial. Confira

Por: Redação -
26/03/2021

Por Murillo Novaes

Quando no inesquecível 8 de maio de 2014 eu coloquei os pés no veleiro trimarã de 101 pés, batizado de IDEC, e começamos a velejar céleres pela Baía de Guanabara, no Rio, na companhia de seu mítico comandante, o francês Francis Joyon, escrevi em uma rede social: “já posso morrer em paz”. O sentimento de estar ali, ao lado do velejador especialista na quebra de recordes, era indescritível para mim. Afinal, além de jornalista, sou velejador de oceano e um ser humano atento aos meus pares incomuns. E não é todo dia que nos é dada a oportunidade de ter com os deuses.

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Quando esteve no Rio, Joyon já era uma lenda na França e na vela de oceano mundial. Em 2008, no seu segundo veleiro trimarã IDEC, ele havia circum-navegado o globo em solitário em nada menos que 57 dias, 13 horas, 34 minutos e 6 segundos, tirando mais de 14 dias do tempo anterior, pertencente à inglesa Ellen MacArthur. A própria Ellen tinha lhe tomado o recorde, três anos antes, por apenas um dia. Ele deu o troco.

Francis Joyon é hoje o maior colecionador
de recordes nos
mares do mundo

Movido a desafios, Joyon havia se tornado o velejador solitário mais rápido do mundo em 2004, quando — a bordo do primeiro IDEC, de 27 metros, ou 89 pés — estabeleceu a marca de 72 dias, 22 horas, 54 minutos e 22 segundos para a volta ao mundo, marca 20 dias mais rápida que a do registro anterior para uma circum-navegação solo. Durante a quebra desse recorde, navegou mais de 28 000 milhas náuticas (51 900 km) a uma velocidade média de 15,5 nós (28,7 km/h). O mesmo barco, que antes se chamava Sport Elec, ganhara o Troféu Jules Verne — o recorde absoluto de volta ao mundo a vela — sob o comando de Olivier de Kersauson, com a marca de 71 dias. Joyon, em solitário, gastou apenas um dia a mais. E isso estando a bordo de um barco não projetado para velejar sozinho, com as velas originais com mais de 10 anos de vida e nenhum roteador meteorológico para auxiliar. Foi o bastante para adentrar, com honras, o panteão das grandes divindades dos oceanos.

Curiosamente, o velejador francês, nascido em 28 de maio de 1956, em Hanches, norte da França, não vem de uma família de velejadores nem sequer de uma região costeira. Até sua adolescência, Joyon jamais havia posto os pés em um barco a vela. Foi num estágio na famosa escola de vela de Glénans que ele viria a tomar gosto pela coisa, rapidamente se tornando o responsável pela manutenção da flotilha da escola.

Aos 63 anos, francis joyon continua atraindo admiração no mundo da vela e conquistando o respeito de todos, com sua capacidade de realizar feitos

Nos anos 1980, com o amigo Paul Vatine, o futuro caçador de recordes na vela fez sua primeira incursão no mundo das grandes travessias oceânicas ao percorrer a rota San Salvador-Cadiz. O pódio inaugural foi um augúrio promissor. Já em 2000, depois de manter a liderança da prova durante todo o tempo — à frente de figuras como Franck Cammas, Marc Guillemot e Alain Gautier —, Joyon venceu a Transat inglesa estabelecendo o recorde de 9 dias, 23 horas e 21 minutos. Um “camponês” marinheiro se introduzia de forma indelével na elite da vela oceânica francesa.

A partir de então, o pequeno e forte velejador não parou de coligir as mais diversas marcas da vela. Desde a singradura (milhas percorridas em 24h) a rotas consagradas, do café, do rum, do chá, com ou sem tripulação, Joyon é hoje o maior colecionador de recordes nos mares do mundo.

Desde a singradura (milhas percorridas em 24h) a rotas consagradas, como a do café, do rum, do chá, com ou sem tripulação, Francis Joyon é hoje insuperável na arte
de realizar feitos nos mares

Atualmente, ele e sua tripulação detêm nada menos que o cobiçado Troféu Jules Verne pela circum-navegação do globo, no seu novo Idec Sport, em 40 dias, 23 horas, 30 minutos, 30 segundos, quase cinco dias a menos que o tempo de referência anterior. E metade do que o próprio Júlio Verne imaginou no que parecia ser um delírio de ficção à época. Detém também o recorde de travessia em solitário do Atlântico. E como não cansa de perseguir proezas, tendo o mar como cenário, o francês voador se propôs fazer nesta temporada o original Tour da Ásia, uma série de percursos entre a Europa e o continente asiático, tendo como desafio maior a travessia Hong Kong a Londres, conhecida como Rota do Chá.

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No comando do trimarã de 97 pés, o herói francês superou a famosa travessia – a Rota do Chá em 4 dias, 3 horas e 26 segundos a famosa travessia. Joyon cruzou a linha de chegada, no rio Tâmisa, depois de navegar 18 576 milhas (29 896 km) em 31 dias, 23 horas, 36 minutos e 46 segundos. De quebra, com a beleza, velocidade e leveza dos grandes albatrozes que cruzam as imensidões oceânicas, ele e sua tripulação detonaram outras marcas pelo caminho. Foi uma grande aventura, uma excursão de conotações históricas, da rota das especiarias, da rota da seda e da rota do chá, três tarefas hercúleas, todas coroadas de glória ao final.

entre os feitos de joyon, o cobiçado Troféu pela circum-navegação do globo, em quase cinco dias a menos que o tempo de referência anterior

Entre a Bretanha e as margens da Ásia e da China, dois novos tempos de referência foram estabelecidos e dois outros recordes, quebrados. Uma viagem épica que pode ser resumida em alguns números: 67 dias de navegação, 35 mil milhas cobertas com média de mais de 20 nós.

Aos 63 anos, o comandante do maxitrimarã Idec Sport continua atraindo admiração no mundo da vela e conquistando o respeito de todos, com sua capacidade de realizar feitos. E tudo isso sem nenhum ruído desnecessário nem os arroubos dos egocêntricos. Francis Joyon é um marinheiro simples, alguém que respeita a natureza e gosta de explorá-la e apreciá-la. Como pude constatar in loco, navegando ao seu lado por um par de míseras horas na Baía de Guanabara, ele é um homem especial também na sua doçura. De seu coração brotam sabedoria, coragem e determinação.

Curiosamente, Francis Joyon, nascido no norte da França, não vem de uma família de velejadores nem sequer de uma região costeira. Até sua adolescência, ele jamais havia posto os pés em um barco a vela

 

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